23/11/2007

Mulheres, religião, repressão e relativismo cultural

Passeando pela net, visitando alguns blogs que gosto muito e onde dou uma passada quase diariamente para saber se ha algo novo, deparei com uma discussão sobre o véu muçulmano.
Discussão que seria muito interessante se as debatedoras tivessem se apoiado somente em fatos e não se deixassem levar por lendas ou pela opinião do "arabe com quem namoro ou com quem saio". Mas claro que também houveram exceções e foram so essas exceções que me fizeram ler os comentarios.
O que me chamou a atenção e o que vem me fazendo pensar um pouco mais nestes ultimos meses sobre a condição feminina neste mundo tão machista e tão misogino foram algumas participantes desta discussão que quiseram comparar a situação da mulher no mundo islâmico e a situação da mulher no mundo não islâmico. "Nos somos tão oprimidas quanto essas mulheres", "Exigem que mostremos o corpo exatamente como exigem que elas o escondam", "Eu conheço muitos muçulmanos e eles são até muito ingênuos" e também passam a um argumento mais doloroso e muito mais sério que é a infibulação feminina.
Eu não estou escrevendo este texto com o intuito de demonizar a religião muçulmana, longe de mim, eu também conheço muçulmanos, tenho uma penca de amigos das mais diversas religiões, tenho um profundo respeito por quem consegue fazer da sua propria religião um assunto privado mas que seja claro, detesto o proselitismo vindo de qualquer religião que seja.
Eu estou aqui agora, sentada diante desse computador porque não sei exatamente como colocar por escrito a minha raiva quanto ao absurdo destas afirmações.
Eu não sou tão oprimida quanto uma mulher que nasceu e mora no Irã e onde existe uma policia especial so para vigiar os trajes feminininos, eu não sou obrigada a me desvestir como é obrigada a se cobrir uma mocinha passeando pelo Cairo, eu nao arrisco a minha vida quando escolho a minha roupa. Por mais que eu acredite no respeito e no multiculturalismo eu não consigo e não quero relativizar uma violência absurda como a excisão ou no seu caso extremo a infibulação feminina.
Eu não vou fazer aqui um relato detalhado deste absurdo(para isso existe internet e um sem numero de informação sobre o assunto), mas gostaria so de lembrar que a excisão é um costume pré islâmico, e se hoje são sociedades muçulmanas na sua maioria a pratica-la podemos encontrar também a mutilação entre sociedades cristãs e animistas, sobretudo em alguns(muitos para o meu gosto) paises africanos.
As religiões monoteistas de uma forma ou de outra sempre oprimiram as mulheres, basta que nos lembremos da inquisição ou que usemos como exemplo o patriarcado judeu ou cristão.
Lembrar-se de tudo isso não ameniza o tratamento dado as mulheres em alguns paises de fé muçulmana, gostaria so que essas pessoas se informassem um pouquinho melhor, tem uma quantidade imensa de coisa interessante por ai para se ler, jornais, livros, até quadrinhos.
Irshad Manji, Nawal el Saadawi, Assia Djebar, Fatima Mernissi, Taslima Nasreen, Marjane Satrapi entre tantas e tantos outros.
Citei somente o nome de mulheres, essas damas tiveram uma relação muito estreita com o islã, nasceram em familias muçulmanas na sua maioria e escreveram sobre a liberdade e a condição feminina, alguns pagam com a propria liberdade, como Nasreen e Manji que vivem com proteção policial ou como Nawal el Saadawi que passou um longo tempo em prisão. Essas mulheres cometeram o mais atroz dos pecados: escreveram sobre a condição de outras mulheres ou delas mesmas dentro da sociedade muçulmana.
E por favor, para terminar "conheço muitos muçulmanos e eles são até muito ingênuos" isso é do racismo puro, acompanhado de uma super dose de complexo de superioridade.

7 comentários:

Woman Once a Bird disse...

Nem mais, Samya. Totalmente de acordo contigo. :)

samya disse...

Muito obrigada pela visita Woman once a bird, e volte quando quiser que a casa é nossa.
Samya

Anônimo disse...

Oi Samya! Estou escrevendo aqui pra não botar mais lenha na fogueira na discussão de lá... ;)
Pois é, já faz muito tempo que leio o blog da Denise e estou sempre caladinha, sou assim por natureza, mas quando vi mulheres dizendo que bom mesmo era antes quando lugar de mulher era em casa, não deu pra ficar calada. É uma falta de respeito com com as mulheres que lutaram tanto por nossos direitos, e uma falta de respeito com as mulheres que arriscam suas vidas ao expor a verdadeira condição da mulher na cultura muçulmana.

Anônimo disse...

Samya.
Ótimo artigo.
Se eu não estivesse indo para o Brasil dia 29, pela manhã, ia te propor um café.
Até a volta.
Maria Lina

samya disse...

Maria Lina, eu continuo por essas terras, me mande uma mensagem quando voltar do Brasil, podemos nos encontra se voce quiser.
Um beijo e uma viagem cheia de sol.
Samya

carta de navegação disse...

é sempre um lance de "nós" e os "outros"... quem é mais fodida? mais discriminada, mais humilhada? nós, cristãs ocidentais ou elas, muçulmanas?
diariamente mulheres, independente da religião, sofrem diferentes tipos de violência.. denuncuar tudo isto e se colocar contra, não aceitar a violência de nenhuma outra pessoa é nosso dever. Mas, comparar, argumentar, dizer: elas são violentadas, oprimidas ou citar qualuqer outra barbárie não faz com que qualuqer mulher deixe de ser vítima de qualuqer violência... quando digo: "eu não vou aceitar isto", mudo minha condição e a condição do outro? quem sabe??
véu, não-véu.. eu uso lenços na cabeça por minha escolha.. eu uso biquinis por minha escolha, eu escolho as pessoas que durmo, por minha livre vontade... e ainda assim sei que sou sujeita a uma série de pressões que, cotidianamente, tenho que administrar...
muito legal vc colocar um texto como este aqui... e da próxima vez, pode nos poupar de pesquisas no google e descer a lenha...se vc não corre nenhum risco de vida ao escolher a roupa que vai vestir é porque tem muito útero pra fazer isto - dando continuidade a uma trajetória iniciada lá atrás...
ufa.. chega... o blog é teu! hahahahahahahaha

beijo

samya disse...

Carta de navegação,é meu e é nosso!